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Briga entre sócios: soluções jurídicas e redução de prejuízos

Quando os sócios brigam, a empresa perde. A melhor solução sempre será, claro, um acordo e o mais rápido possível. Contudo, há ocasiões em que os interesses se tornam inconciliáveis, e o litígio inevitável. 

Como em qualquer caso, a prevenção é melhor do que o remédio.

1. Prevenção de conflitos

Prevenção significa, na constituição da sociedade, redigir os instrumentos de governança (contrato social, estatuto, acordo de acionistas ou de quotistas etc.) de modo a estabelecer, desde logo, regras de conduta para situações de estresse societário. Pode ser feito na constituição da sociedade, ou posteriormente, desde que antes de qualquer conflito: em resumo, combinar em tempos de paz como será o procedimento em tempos de guerra. 

Nem todas as cláusulas precisam estar no contrato social ou no estatuto. Esses documentos são de regular acesso por terceiros, e nem sempre interessa que regras de governança estejam neles inseridas. Uma opção é fazer um acordo de quotistas ou de acionistas, segundo a natureza jurídica da sociedade (LTDA ou S.A), os quais não precisam de publicidade para terem valor perante os sócios, e neles inserir toda sorte de procedimentos que as partes entendam devidos. 

Assim, independentemente se no estatuto ou no acordo, listamos abaixo algumas cláusulas úteis à prevenção de litígios societários.

  • Exclusão por justa causa: Regra prevista no artigo 1.085 do Código Civil para sociedades limitadas, na qual os sócios que compõem a maioria do capital social podem excluir um sócio que esteja colocando em risco a continuidade do negócio. O próprio contrato pode listar algumas condutas desde logo classificadas como passíveis de exclusão, tais como concorrência com a própria sociedade, difamação da sociedade e/ou dos sócios, falta de engajamento mínimo, ausência nas deliberações sociais dentre outras.
  • Quóruns qualificados: Quando um determinado sócio possui uma fatia considerável do capital, as partes podem selecionar determinados temas para os quais seja possível prever quóruns qualificados de deliberação, ou seja, exigência de um percentual mínimo de votos positivos para aprovação daquelas matérias selecionadas.
  • Regras de engajamento: Quando necessário o trabalho dos sócios, vale perder um tempo e definir regras de engajamento mínimo, sem o qual um determinado sócio pode ser excluído da sociedade ou penalizado de alguma modo, inclusive de forma pecuniária.
  • Punições pecuniárias: Nas sociedades limitadas é possível a distribuição de lucros desproporcional ao capital social, de acordo com a deliberação dos sócios. Desse modo, é possível já deixar previamente deliberado os casos em que a distribuição se dará de forma desproporcional se os sócios realizarem, ou deixarem de realizar, determinadas ações. Funcionará como uma penalidade pecuniária, de fácil aplicação.
  • Sucessão: Uma grande fonte de conflito é o ingresso de herdeiros na sociedade: seja na relação entre eles, seja na relação entre esses e os sócios remanescentes. Daí que de todas as regras de prevenção, as que tratam de falecimento são as mais importantes. Não raro os contratos e estatutos sociais trazem aquela cláusula padrão tratando apenas de como serão pagos os herdeiros, ou se poderão ser aceitos ou não na sociedade. No entanto, faz-se necessário muito mais do que isso. Como são apurados os haveres dos herdeiros? Balanço contábil, fluxo de caixa descontado, multiplicador de EBITDA ou outra regra de valuation? Havendo divergências quanto ao valor apurado, o que acontece? Qual quórum para deliberar pela entrada ou não de herdeiros? Depois da entrada dos herdeiros, existe alguma diferença de peso nas deliberações entre sócios fundadores e herdeiros? Essas e várias outras questões podem ser tratadas previamente nos instrumentos de governança das sociedades quanto à sucessão, e não só por morte, mas também em caso de alienação de quotas/ações.

Além dessas, diversas regras comumente presentes em acordos de acionistas ou quotistas também ajudam a evitar conflitos, tais como definição de prazo mínimo dentro do qual nenhum dos sócios pode alienar suas quotas/ações, regras para venda conjunta (drag e tag along), condições através das quais uma quota/ação pode ser vendida a terceiros, consequências de uma restrição judicial sobre quotas/ações, casos de dissolução parcial e apuração de haveres de sócios descontente, dentre outras.

Como se viu, o caminho é amplo para evitar o conflito. Mas uma vez instalado, como resolver?

2. Solução de conflitos

2.1. Exclusão judicial

Se para exclusão por justa causa extrajudicial há necessidade de previsão contratual, a exclusão judicial prescinde de cláusula nesse sentido.

O artigo 1.030 do Código Civil prevê que um sócio pode ser excluído judicialmente, mediante a deliberação da maioria dos demais sócios, por falta grave no cumprimento de suas obrigações.

O conceito de falta grave é subjetivo, e a falha precisará ser provada em juízo. Um sócio que deixar de cumprir funções que antes as realizava a contento, ou que as realiza de forma desidiosa já caracteriza, se bem demonstrada, uma falta grave. Como nem sempre se torna fácil tal demonstração, recomenda-se que antes da ação judicial tais falhas sejam documentadas através de notificações extrajudiciais.

2.1. Dissolução parcial extrajudicial e judicial

Há casos, contudo, que inexiste falha, mas tão somente um desgaste relacional entre os sócios, o que tecnicamente se chama de quebra do affectio societatis. Aqui não será caso de exclusão, mas de dissolução parcial.

A dissolução parcial acontece quando um sócio comunica à sociedade e aos demais sócios o seu desejo de se retirar (artigo 1.029 do Código Civil).

A notificação produz efeitos 60 dias depois de recebida, quando esse sócio não mais fará parte do quadro societário. Com a notificação, o sócio se dirige à Junta Comercial, faz o registro desse documento e o seu requerimento para que seja excluído do cadastro da empresa, o que será feito considerando a data acima (60 dias após o recebimento da notificação de retirada). Na próxima alteração contratual, estará a sociedade obrigada a mencionar em seu contrato social a nova formação societária. Como se vê, trata-se de procedimento extrajudicial quando a dissolução se dá por iniciativa daquele que quer se retirar.

Se, ao contrário, uma maioria quer dissolver a sociedade em relação a um único sócio – ou seja, no lugar de um sócio desejar sair, os demais desejarem excluí-lo –, será necessária uma ação judicial. Isso porque não há previsão legal de procedimento para exclusão de sócio tão somente por quebra de affectio societatis.

Assim, deverá ser requerido ao juiz da causa a dissolução parcial para indenização daquele sócio, apelando ao princípio da conservação da empresa, sustentando o fato de o referido sócio ser minoria, e ter a maioria melhores condições de continuar o negócio: a decisão dependerá dos contornos do caso concreto.

Até aqui, tratamos de saída do sócio, mas não do valor de sua quota, e da apuração dos seus haveres. Esse é um segundo procedimento, que não acontece em conjunto, mas em momento posterior: primeiro exclui o sócio, depois apura os haveres.

3. Apuração de haveres

Qualquer que seja o motivo ou a forma (e acima tratamos de vários motivos e formas) pelo qual um sócio saia da sociedade, a sua quota precisa ser liquidada, ou seja, é o procedimento pelo qual será aferido o valor da participação que o sócio mantinha na sociedade.

O artigo 1.031 do Código Civil determina que a liquidação se dará com base no que estipula o contrato social, e inexistindo regra específica pactuada, com base na situação patrimonial da sociedade, à data da resolução, verificada em balanço especialmente levantado. Com isso, o capital social sofrerá a correspondente redução, salvo se os demais sócios suprirem o valor da quota. E a quota liquidada será paga em dinheiro, no prazo de noventa dias, a partir da liquidação, salvo acordo, ou estipulação contratual em contrário.

Nem sempre há valores a pagar. Uma liquidação pode resultar em valor negativo: é o caso de uma sociedade endividada, na qual o seu passivo com terceiros (dívidas) se afigura maior do que o seu ativo (bens e direitos). Nesse caso, o patrimônio líquido é negativo, e o sócio que sai, no lugar de receber, precisa pagar.

Uma dúvida que sempre surge é a seguinte: o balanço contábil para apuração de haveres é o contábil, ou faz-se algum ajuste no mesmo a fim de considerar bens não contabilizáveis, tais como marca e fundo de comércio, de modo a chegar em um valor real para a participação do sócio?

O código civil é silente, de modo que a maioria dos juízes aplicavam a apuração meramente contábil, em regra prejudicial ao sócio retirante. Com o Código de Processo Civil (CPC) de 2015, procedimentos mais detalhados foram introduzidos no que tange à apuração de haveres. 

O artigo 606 do CPC/2015 estabelece que em caso de omissão do contrato social, o juiz definirá, como critério de apuração de haveres, o valor patrimonial apurado em balanço de determinação, tomando-se por referência a data da resolução e avaliando-se bens e direitos do ativo, tangíveis e intangíveis, a preço de saída, além do passivo também a ser apurado de igual forma. Além disso, em todos os casos em que seja necessária a realização de perícia, a nomeação do perito recairá preferencialmente sobre especialista em avaliação de sociedades.

Com o novo CPC, a avaliação tende a ser mais justa, na medida que não mais se limita ao patrimônio contábil, mas considera o patrimônio a preço de saída (na contabilidade tradicional, ao contrário, se dá sempre a custo), contabilizando-se ainda os intangíveis. 

Em resumo, para facilitar a visualização, segue uma tabela esquematizando os conceitos acima:

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